Universalização do Ensino Básico

On 01/21/07 05:54 . Updated at 01/24/12 08:26 .
As taxas de repetência e evasão voltaram a crescer
Universalização do ensino básico
As taxas de repetência e evasão, que tinham caído, voltaram a crescer

RUBEN KLEIN

Auniversalização do Ensino Fundamental (EF) é um mito.O que está realmente universalizado é o acesso, pois, segundo a Pnad de 2005, 99% das crianças têm acesso à 1asérie, e 94% das crianças de 7 a 14 anos estão matriculadas nesse ensino. A conclusão do EF não está universalizada: somente 70% dos jovens chegam ao término, e muitos através da Educação de Jovens e Adultos.

Quando se discute essa universalização, não se menciona o atraso da maioria dos alunos brasileiros em relação à série que deveriam estar cursando. Segundo a Pnad, na idade escolar de 15 anos, idade sem atraso para a conclusão do EF, somente 41% dos jovens já o concluíram. Ou seja, no Brasil, menos da metade dos jovens conclui o EF com a idade correta. Se considerarmos os que concluíram o EF aos 16 anos, esse percentual chega apenas a 55%.

O atraso começa cedo e aumenta com a idade. Aos 7 anos, o percentual de crianças sem atraso é de 89%, aos 10 anos cai para 66%, aos 14 anos para 45% e aos 17 anos para 26%.

Apesar do atraso, somente 1% das crianças de 10 anos estão fora da escola. Isto significa que os alunos atrasados continuam se matriculando, demonstrando que as famílias brasileiras desejam ver seus filhos na escola e aprendendo. Mas o crescente atraso (ou repetência) acaba resultando na evasão. O percentual de evasão sobe para 8% aos 14 anos e 32% aos 17 anos.

Após a queda nas taxas de repetência e evasão na década de 1990, elas se estabilizaram no final da década, mas estão recomeçando a crescer, especialmente nas últimas séries. Dessa maneira, a previsão é que o atraso dos estudantes aumente nas idades mais altas provocando um aumento do percentual de alunos fora da escola e uma queda dos percentuais de conclusão. Já se observa uma queda do número de concluintes do EF e uma queda do número de alunos promovidos à 1asérie do Ensino Médio (EM).

Quanto ao desempenho cognitivo em língua portuguesa (leitura) e matemática, o Sistema Nacional da Avaliação Básica (Saeb) do Ministério da Educação mostra que a qualidade do ensino está ruim.

As políticas educacionais mais faladas hoje em dia são o Fundeb e a ampliação do EF de 8 para 9 anos. Infelizmente, sozinhas, não resolverão o problema.

O Fundef, a política de financiamento do EF, não produziu queda nas taxas de repetência e evasão e aumento no desempenho dos alunos do EF e não há porque achar que vai ser diferente com o Fundeb, uma ampliação do financiamento para o Ensino Básico (Educação Infantil, EF, EM e Educação de Jovens e Adultos). Isso não quer dizer que o Fundeb não seja necessário, ele é importante para organizar o financiamento do Ensino Básico. Mas é preciso cuidado.

Como a distribuição dos recursos é feita pelo número de matrículas, a verba relativa ao EF pode cair, pois a matrícula está inchada e a tendência é continuar a decrescer nos próximos anos. Hoje em dia, a matrícula do EF é mais de 20% maior do que a necessária se todas as crianças de 7 a 14 anos estivessem matriculadas na série correta para sua idade. O correto seria, pelo menos, manter a verba atual desses 8 anos e dessa maneira aumentar a verba por aluno nesse segmento.

Deveria haver novos recursos para o ano inicial do EF aos 9 anos.

A ampliação do EF para 9 anos é bem-vinda, mas sem outras medidas não melhorará necessariamente o fluxo escolar e o desempenho dos alunos. Pode até piorar o atraso, como é o caso no Estado do Rio de Janeiro, que há cerca de 20 anos instituiu de fato um EF com 9 anos em todas as redes, incluindo como série inicial a Classe de Alfabetização (CA). No Rio, o atraso e/ou repetência começa na CA e, apesar de 97% das crianças de 7 anos estarem na escola, somente 81% delas não têm atraso. Os 16% com atraso estão na CA ou na pré-escola. O atraso não é recuperado, e somente 57% das crianças de 10 anos, 42% de 14 anos e 26% de 17 anos estão sem atraso.

Além disso, o Saeb e, mais recentemente, a Prova Brasil, mostram que o desempenho dos alunos do Estado do Rio de Janeiro é semelhante ao dos alunos dos demais estados da Região Sudeste, que tinham um EF de 8 anos.

Só aumentar recursos e o número de dias e horas de aulas não basta para melhorar a educação.

Para viabilizar a universalização de conclusão do EF e do EM é necessário urgentemente retomar o processo de queda das taxas de repetência e evasão para atingir níveis menores que 5% e 1%, respectivamente, em cada série, sem descuidar da qualidade do ensino. É preciso ensinar e passar o aluno de ano. É melhor passar o aluno e recuperá-lo do que reprovar e provocar uma futura evasão.

Isso é possível. Existem indicações do que fazer. Depende de todos nós.

O futuro do país não é função somente da educação, mas sem uma educação de qualidade não há futuro.

Source: O Globo